Olá pessoal, tudo bem com vocês?
Na última vez que escrevi aqui no Blog abordei uma parte da realidade das escolas no Brasil em plena pandemia. Escrevi sobre uma turma que havia virado três e os comentários que foram sendo disseminados nas mídias sociais sobre o trabalho docente. Claro que utilizei criatividade e ironia em um texto que ambicionava a ampliação do debate, mas que não me omiti de colocar nele minhas impressões e opiniões, bem como, de utilizar argumentos capazes de suportá-las. No entanto, muitas coisas ainda precisavam ser ditas e penso ser este o momento ideal para fazê-lo.
No texto de hoje abordo mais uma dimensão desta (e de muitas outras turmas) que viraram três e os desafios que foram sendo colocados para as escolas (infelizmente, desafios que continuam sendo colocados por causa da continuidade da pandemia).
Inicio perguntando sobre as (im)possibilidades de realizarmos práticas efetivas na escola, com diferentes turmas e realidades sociais, em tempos de tanta instabilidade e insegurança (na saúde e na educação, por exemplo), colocadas como desafios pela COVID-19 de forma empírica. A Charge de Cícero, sobre os medos e incertezas na escola da 'pandemia' nos faz pensar sobre isso...
Fonte: http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/modules/galeria/detalhe.php?foto=80&evento=10 Acesso em: 12 ago 2021.
O fato é que não sabemos tudo sobre a COVID e o medo tem permeado as relações entre os diferentes sujeitos da escola. Ou seja, um 'simples' espirro pode se tornar algo muito ameaçador!
Meu avatar, atualizado! ;)
As vezes me pego perguntando: Como será que os estudantes poderiam narrar suas experiências escolares nos anos de 2020 e 2021? Como eles as descreveriam? O que foi aprendido e o que não foi? Quais serão os impactos da escola para estudantes das redes públicas e privadas? Serão estes impactos iguais ou apenas aumentarão ainda mais as diferenças entre estudantes de escolas públicas e privadas da educação básica? Será que eles (e nós também) temos a dimensão dos efeitos, impactos e lacunas que este ano e meio de 'escola diferente' teve para os alunos das diferentes redes?
Observem que são muitas as questões que se colocam. O que significa que temos ainda muito sobre o que conversar. Ao longo das postagens subsequentes a esta, pretendo ir abordando cada uma destas possibilidades de reflexão e conto com a ajuda de vocês (através dos comentários) para definir os próximos 'alvos' (temas).
Para não perder o foco acho necessário ajustar as lentes e fazer algumas escolhas. E começo me questionando sobre essa escola de 2020 e 2021 que se tornou múltiplas. Será que a escola de março de 2020 era a mesma de dezembro de 2019? Como almejar uma ida à escola que não é mais a mesma de antes da pandemia e que precisou se reinventar? Em que medida os atravessamentos das cinco escolas da pandemia (eu as chamo assim) ainda permitem a observação de traços que remontam ao pastoreio e ao coronelismo frente ao anúncio das possibilidades de uma educação pública cívico militar? Tudo isso num país que afirma em sua Carta Magna, entre outros aspectos, que a educação deve ser laica?
A cada parágrafo que escrevo outras dúvidas me atravessam e as vivências enquanto residente pedagógica, estagiária, professora e pesquisadora da área da Educação a mais de 15 anos, que não podem ser indissociadas, me fazem ter apenas uma certeza: não sei bem como será a educação e a escola pós pandemia.
Como provoquei vocês no título desta postagem, a pensarem em uma escola que virou cinco na pandemia, acho importante explicar quais são, para mim, as cinco escolas da pandemia. Alguns destaques: essa é a minha visão sobre os acontecimentos, não esgota e nem se anuncia como verdade absoluta sobre a realidade observada. São as minhas lentes. Meu olhar e as possibilidades trazidas pelas minhas experiências que compartilho com vocês que me acompanham no Blog.
As cinco escolas da pandemia são (em minha opinião):
1) a Escola do Ensino Remoto Emergencial (todas as escolas fechadas e os professores e diretores precisaram pensar em alternativas para fazer chegar aos estudantes os materiais de forma impressa e/ou digital – março de 2020). Não tivemos tempo para nos preparar para ela. Tudo foi sendo pensado concomitantemente e ela nasceu travestida da 'excepcionalidade' do "Estado de Exceção". Erros e acertos emergiram a partir das práticas propostas. Nesta escola fizemos o que foi possível fazer. Os/as professores/as precisaram se apropriar de novas ferramentas e tecnologias 'a toque de caixa'. Muitas práticas e equipamentos eram tradicionais e quase obsoletos. As dificuldades de pensar a escola assíncrona e não presencial exigiram reflexões sobre o sucesso e o fracasso da escola antes da pandemia. Os pais e responsáveis legais pelas crianças assumem o papel de 'mediadores da escola' e precisam auxiliar os estudantes em suas casas. Muitas vezes, conciliando outras funções e rotinas.
2) a Escola em Rede (de agosto a dezembro de 2020). Mantém-se as escolas fechadas e as alternativas de comunicação ficaram majoritariamente vinculadas às redes sociais como Facebook e Whatsapp porque os estados e municípios ainda não tinham disponibilizado ferramentas tecnológicas e formações/capacitações específicas para as demandas pós pandemia para professores, escolas e estudantes. Esperava-se com ansiedade o acesso aos logins em redes e o acesso ao Google Classroom. As dificuldades de acesso as tecnologias ampliaram as diferenças entre estudantes e escolas das redes públicas e privadas de ensino. As desigualdades tornam-se evidentes. Busca-se manter o interesse dos estudantes e evitar a evasão escolar. Pais e responsáveis legais começam a se cansar da rotina de 'mediar a educação'. Os professores e demais atores da escola já tem um pouco mais de contato e domínio das tecnologias. Já estão mais acostumados com as novas demandas da Escola em Rede. Alguns/mas, paulatinamente, estão se transformando em professores/as tubers (em analogia aos Youtubers, influenciadores etc.). Aulas mais interativas são propostas. Encontros síncronos e atividades a distância se mesclam ao longo das semanas e remessas de estudos (termo utilizado na escola na qual desenvolvi minha residência pedagógica). Investimentos em mesas, cadeiras, internet e computadores é feito (pelos/as profissionais) para que possam produzir e entregar mais qualidade nos materiais disponibilizados para os estudantes em casa e na escola). Nota-se certo adoecimento docente (professores/as com estresse e muito cansados se afastam da escola). O mesmo se observa em relação aos estudantes: distanciamento, apatia, depressão passam a ser tema dos debates e das reuniões virtuais. Uma pergunta não cala: o que será destes estudantes quando a 'escola de 2019' retornar? Outra se cola nela: É possível uma escola igual a de 2019 depois que a pandemia acabar?
- Parecer CNE/CP nº 6/2020, aprovado em 19 de maio de 2020 - Guarda religiosa do sábado na pandemia da COVID-19.
- Parecer CNE/CP nº 9/2020, aprovado em 8 de junho de 2020 - Reexame do Parecer CNE/CP nº 5/2020, que tratou da reorganização do Calendário Escolar e da possibilidade de cômputo de atividades não presenciais para fins de cumprimento da carga horária mínima anual, em razão da Pandemia da COVID-19.
- Parecer CNE/CP nº 10/2020, aprovado em 16 de junho de 2020 - Prorrogação do prazo a que se refere o artigo 60 do Decreto nº 9.235, de 15 de dezembro de 2017, para implantação de instituições credenciadas e de cursos autorizados, em razão das circunstâncias restritivas decorrentes da pandemia da COVID-19.
- Parecer CNE/CP nº 11/2020, aprovado em 7 de julho de 2020 - Orientações Educacionais para a Realização de Aulas e Atividades Pedagógicas Presenciais e Não Presenciais no contexto da Pandemia.
- Parecer CNE/CES nº 498/2020, aprovado em 6 de agosto de 2020 – Prorrogação do prazo de implantação das novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs).
- Parecer CNE/CP nº 15/2020, aprovado em 6 de outubro de 2020 - Diretrizes Nacionais para a implementação dos dispositivos da Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020, que estabelece normas educacionais excepcionais a serem adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.
- Parecer CNE/CP nº 16/2020, aprovado em 9 de outubro de 2020 - Reexame do item 8 (orientações para o atendimento ao público da educação especial) do Parecer CNE/CP nº 11, de 7 de julho de 2020, que trata de Orientações Educacionais para a Realização de Aulas e Atividades Pedagógicas Presenciais e Não Presenciais no contexto da pandemia.
- Parecer CNE/CP nº 19/2020, aprovado em 8 de dezembro de 2020 - Reexame do Parecer CNE/CP nº 15, de 6 de outubro de 2020, que tratou das Diretrizes Nacionais para a implementação dos dispositivos da Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020, que estabelece normas educacionais excepcionais a serem adotadas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.
- Resolução CNE/CP nº 2, de 10 de dezembro de 2020 - Institui Diretrizes Nacionais orientadoras para a implementação dos dispositivos da Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020, que estabelece normas educacionais excepcionais a serem adotadas pelos sistemas de ensino, instituições e redes escolares, públicas, privadas, comunitárias e confessionais, durante o estado de calamidade reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020;
3) a Escola Híbrida (de fevereiro de 2021 até setembro de 2021), que propôs possibilidades de retorno ao ensino presencial de forma escalonada e/ou o não retorno presencial – uma turma foi dividida em três: turma A e B (alternando uma semana em casa e uma na escola) e Turma C (aqueles que não regressaram ao ensino presencial. O Classroom se tornou a principal ferramenta de comunicação entre escola, estudantes e famílias. Mas se mantém a comunicação por intermédio dos grupos de Whatsapp. Professores/as não aguentam mais os atravessamentos de tempos por causa das tecnologias. As atividades da escola não se restringem aos horários de trabalho. Em casa, sábados, domingos e feriados pais e estudantes colocam demandas sobre eles. Não são respeitados os momentos de descanso. Não é mais o tempo da 'excepcionalidade' do primeiro ano da pandemia, as ações já foram pensadas, mas a implementação de uma escola que se transforma em três (da mesma forma que as turmas) não teve suas dimensões e impactos ainda analisados. Alguns estudantes evadiram. Outros, estão cada dia mais calados. Pergunta-se: O que estão aprendendo nestes últimos anos? O que estamos ensinando? Qual o papel da escola? Pais e responsáveis legais, além de outros atores da escola como profissionais do transporte escolar pressionam para o retorno as atividades presenciais. Motivos das solicitações: econômicos e sociais.
Esta escola segue os mesmos documentos normativos da Escola em Rede;
4) a Escola 'Quase' Presencial (ou seria uma tentativa de retorno a escola de 2019?), na qual o retorno presencial escalonado (entre setembro e novembro) não apenas de partes da turma, mas da escola como um todo (com alternância de horários de chegada, saída, alimentação e ainda sem recreio) é a alternativa. Tenta-se voltar a 'escola de 2019', adotando-se rígidos protocolos sanitários para garantir a segurança de todos. Ajustam-se horários, rotinas e práticas. Os estudantes estão eufóricos por se encontrarem novamente, mas ao mesmo tempo, frustrados porque as regras mudaram. Contatos físicos são proibidos. Compartilhamento de materiais, também. Em algum momento teremos que resgatar a solidariedade e empatia da e na escola... mas esse será apenas mais um desafio pós pandemia. As diferenças de aprendizagem se apresenta, gritantes e desafiadoras. Outra vez perguntamos: O que estamos ensinando? O que os estuantes estão aprendendo? Pra que serve a escola? É preciso reaprender a se relacionar presencialmente. Isso vale para os estudantes e demais atores da escola. O comportamento parece ser - neste momento - foco de atenção emergencial.
Esta escola segue as mesmas orientações das escolas anteriores; e
5) a partir de novembro de 2021 direciona-se, agora sem que as famílias possam optar por uma forma ou outra, para o retorno presencial daquela que não pode mais voltar a ser ‘a velha escola’, a esta chamo: Escola do Hoje. Esta escola não é mais a escola do possível, dos ajustes, das tentativas. Essa é a escola do presente. Muito poderia ser dito sobre ela. Mas seus impactos, potencias, dificuldades e lacunas ainda não se fizeram visíveis. Isso é tema para pesquisas nos próximos anos (2022, 2023 etc.). Mas essa escola não é mais a mesma de 2019. Nela as tecnologias não podem mais ser esquecidas, deixadas de lado ou proibidas. As práticas precisam ser revistas e revisitadas. Pergunta-se pela escola do amanhã!
Esta escola que segue os outros documentos citados neste post e mais os dois pareceres a seguir:
Ao chegar ao final deste texto fiquei me perguntando (já viram que adoro perguntas) se essa quinta escola é a Escola de 2022 ou se a escola do ano novo já vai ser uma sexta... Bem, acho que esse será um tema de um post no futuro.
Por enquanto deixo aqui um poema de Paulo Freire que nos faz pensar.
Fonte: https://tiaeron.files.wordpress.com/2012/04/escola.jpg Acesso em: 12 ago 2021.
Nos encontramos em breve!
E lembrem-se: a pandemia não acabou!
Dani